Cinema

Cinema: Resenha IN de ‘Resistência’

Ficção científica da Disney traz debate sobre inteligência artificial em narrativa distópica 

A inteligência artificial está em todo o lugar, tomando conta da discussão social. O ChatGPT e as mais diversas formas de automação de tarefas dominam o noticiário não só de tecnologia, mas de saúde, política, economia, comportamento e, até mesmo, de cultura. 

A atual greve em Hollywood, que caminha para ser a maior da história da indústria de entretenimento, tem como uma das reivindicações o uso da inteligência artificial nas produções. 

Lançado em um contexto onde a maioria das produções está paralisada em Hollywood, Resistência, novo filme da 20th Century Studios, divisão adquirida pela Disney após a compra da Fox, traz uma trama que discute, justamente, o motivo da greve: os limites e as possibilidades da inteligência artificial

Retratando um futuro distópico, em meio a um planeta tomado por uma guerra entre os humanos e a inteligência artificial, o filme apresenta Joshua (John David Washington), ex-agente militar recrutado para localizar e matar ‘O Criador’, um misterioso arquiteto responsável por desenvolver uma arma capaz de acabar com toda a humanidade. 

Desde o começo, o filme faz questão de deixar claro quem são os verdadeiros vilões por trás da história, apresentando toda a violência e barbárie que os seres humanos são capazes de cometer em prol de ‘um bem maior’. 

Em filmes de distopia, a humanidade sempre chega ao “fim” por algum motivo essencialmente humano, desde a influência de um governo autocrático ou a luta por direitos e garantias fundamentais. 

Em Resistência, essas questões da natureza humana são contrapostas com as possibilidades que a inteligência artificial oferece para o mundo, dividindo a civilização em dois grupos: aqueles que querem eliminar a IA e os robôs que ela criou, e aqueles que lutam pela liberdade dessas tecnologias. 

Joshua é o nosso guia nesse universo, uma pessoa que, logo no começo do filme, após perder Maya (Gemma Chan), a sua mulher, e o filho que ela carregava na barriga, em uma invasão na sua casa, perde completamente a fé e a esperança em si, na humanidade e na tecnologia. 

Contudo, após a Coronel Jean Howell (Allison Janney) dar esperanças de que Maya está viva, Joshua se une ao grupo de militares que procuram pela arma desenvolvida pelo Criador – ou, como o filme também estabelece como sinônimo, Nirmata.  

A grande surpresa, porém, é que essa arma é uma criança (Madelaine Yuna Voyles), o que coloca Joshua diante de um dilema moral – e existencial. 

Diante de todos os conflitos que aflige Joshua, ele embarca em uma jornada à procura de sua esposa, lidando com uma criança que é, potencialmente, uma arma de destruição em massa, enquanto tenta desvendar a localização e a verdadeira identidade de Nirmata

DIREÇÃO, TRILHA SONORA E FOTOGRAFIA

A direção e o roteiro do filme são de Gareth Edwards, responsável por Rogue One (2016), um dos melhores filmes dessa nova leva de produções do universo Star Wars nos cinemas. 

Aqui, o grande acerto de Edwards é manter a trama focada nos conflitos de Joshua enquanto lida com uma humanidade completamente perdida em sua própria violência e uma IA que provoca dúvidas em relação à sua natureza. 

Mesmo com a criação de um universo denso, repleto de possibilidades, a crítica ainda gira em torno do que nos torna humanos.

O subtexto de Resistência é tão explícito que, em dado momento, o filme parece discutir a realidade de Hollywood, com sugestões que dão a tônica da greve em curso – há uma piada no longa sobre a cessão voluntária do uso de imagem para criação de réplicas robóticas. 

Tudo isso só se torna possível com a trilha sonora do Hans Zimmer, sempre imponente, marcando presença ao longo das duas horas e treze minutos de filme, que somadas à fotografia do Greig Fraser, criam um universo particular e memorável.

A dupla, que atuou junta em Duna (2021), repete a dose e proporciona uma ambientação digna de uma distopia, com locações que mesclam o uso do CGI e cenários reais, além de cores contrapostas entre a humanidade e a inteligência artificial.   

Dividido em quatro capítulos, a história flui sem que você sinta o peso dela, ainda que repleta de clichês do gênero da ficção científica. 

ATUAÇÕES 

John David Washington se esforça para entregar um personagem em sofrimento. Joshua é um protagonista veterano de guerra, que perdeu uma perna e um braço em missão, e vive com próteses e medicamentos. 

Sua esposa, Maya, é sempre retratada como o completo oposto, alguém que trazia um lado menos doloroso para Joshua. 

O mistério em torno do seu destino é construído diante da inexpressividade que a Gemma Chan consegue transmitir, com seu jeito meio ‘robótico’ de ser. 

Aqui, novamente, ela está em contato com robôs e inteligência artificial, quase que reprisando seu papel na série britânica Humans (2015 – 2018). 

Allison Janney, em contrapartida, consegue se destacar como uma líder mercenária do exército, destoando completamente dos papéis cômicos que já interpretou ao longo de sua carreira. 

Ela não está no mesmo nível que apresentou em Eu, Tonya (2017), mas entrega uma atuação sólida.

Por outro lado, Ken Watanabe tem uma atuação genérica como líder de uma insurgência tecnológica. 

Parece que a escalação tem um objetivo muito específico: entregar conteúdo para o mercado asiático, já que não há um grande destaque em seu papel. 

Quem já o viu em O Último Samurai (2003) ou em Cartas de Iwo Jima (2006) certamente espera algo a mais. 

Resistência é a nova aposta da Disney em um ano marcado pela greve de Hollywood e pelo sucesso absoluto de Barbie. Sorte ou não, o filme terá o final do ano inteiro para atingir sua marca e conquistar o público. Ao menos, qualidade ele tem. 

FICHA TÉCNICA 

Resistência (2023)

Título Original: The Creator 

Gênero: Ficção Científica 

Duração: 02h13min 

Direção: Gareth Edwards 

Roteiro: Gareth Edwards 

Elenco: John David Washington, Gemma Chan, Ken Watanabe e outros. 

Estreia nacional: 28 de setembro de 2023 

Nota: 8,5/10 


Equipe Canal In

Repórter: Marco Dias

Editor: Ricardo Henrique

Foto: divulgação